Por Cleber Lourenço e Gabriel Gomes
O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta segunda-feira (9), o o interrogatório dos oito acusados de tentativa de golpe de Estado em 2022. Entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), o grupo faz parte do chamado “núcleo crucial” ou “núcelo 1” da organização criminosa que atuou pela ruptura democrática. A Primeira Turma do Supremo convocou sessões de segunda-feira (9) a sexta (13).
O primeiro a ser ouvido foi Mauro Cid, que fechou uma delação premiada com a Polícia Federal. Os outros sete réus serão interrogados em ordem alfabética: Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Além de Cid, somente Ramagem foi interrogado.
Bolsonaro e os demais réus foram denunciados por supostamente liderar um plano no fim de 2022 para evitar a posse de Lula à Presidência da República. As principais acusações contra o ex-presidente estão relacionadas à edição de minutas de decreto e tentativa de conseguir apoio dos chefes das Forças Armadas para as iniciativas golpistas.
Todos os oito respondem pelos crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, associação criminosa armada, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado.
Antes dos depoimentos, o ex-presidente Jair Bolsonaro e Mauro Cid se encontraram e se cumprimentaram.
Cid afirmou que a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os acusados de tramar um golpe de Estado no país é verídica, e que ele “presenciou grande parte dos fatos, mas não participou deles”.
O tenente-coronel confirmou a existência da minuta golpista e disse que o ex-presidente Jair Bolsonaro “enxugou o documento, retirando a prisão de autoridades”. “Somente o senhor ficaria preso”, admitiu Cid a Moraes. “O resto conseguiria um habeas corpus”, respondeu ironicamente o ministro.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro confirmou que recebeu do major Rafael de Oliveira um documento com planejamento para monitoramento do ministro Alexandre de Moraes. Ainda no depoimento, Cid afirmou que ficou sabendo pela imprensa do plano para assassinar Moraes e outras autoridades, chamado de Punhal Verde e Amarelo.
O tenente-coronel Mauro Cid afirmou que os acampamentos golpistas em frente a quartéis contavam com o “apoio tácito” do Exército e foram financiados por empresários ligados ao agronegócio. Segundo ele, o general Braga Netto era o encarregado de fazer contato com os acampados.
Cid relatou que Jair Bolsonaro articulou com os comandantes militares a publicação de notas que legitimavam a permanência dos manifestantes nas portas das unidades. A ordem era dar “esperança” aos acampados enquanto se buscava apoio para um golpe.
Sobre o financiamento, Cid disse que empresários do agro mantinham a estrutura dos acampamentos, especialmente em Brasília, bancando alimentação e logística.

Mauro Cid sendo interrogado por Alexandre de Moraes. (Foto: Gustavo Moreno/STF)
Segundo Cid, havia uma “pressão grande” para a troca de comando do Exército para militares agirem. “Uma alternativa seria trocar os comandantes para que o próximo comandante do Exército assinasse ou tomasse uma medida mais dura e radical. Isso está naquele contexto de pressionar o presidente para assinar um decreto. Só não consigo dizer qual decreto, mas que ele assinasse um decreto para determinar um estado de sítio ou defesa.”
Cid confirmou na frente do ex-presidente e dos outros réus pela tentativa de golpe de Estado que o general Walter Braga Netto entregou dinheiro vivo para custear a ação dos kids pretos, nome dado aos militares da força de elite do Exército. “Depois de um tempo o general Braga Netto trouxe uma quantia em dinheiro, que eu não sei precisar quanto foi, mas com certeza não foi R$ 100 mil, até pelo volume”, disse.
Sobre esse episódio, o ministro Luiz Fux perguntou a Cid: “Lhe foi entregue um envelope ou um saco de vinho, alguma coisa assim, que estava lacrado?. O interrogado confirmou: “Estava lacrado, sim senhor”. Fux continuou: “O senhor teve conhecimento do conteúdo que tinha?”. Cid: “Não, o valor não, sr. Não não mexi”. Moraes nesse momento perguntou: “O sr. diz que não teve conhecimento do valor, mas era dinheiro?”. O tenente-cornel reafirmou: “Era dinheiro, sim sr.”. Fux, então, pergunta: “O sr. abriu?” E Cid fala: “Não abri”.
O ex-ajudante de ordens disse que teve uma “conversa informal” com o general Estevam Cals Theóphilo logo após ele se reunir com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Após o encontro, o general teria lhe dito que o “Exército iria cumprir” se Bolsonaro assinasse a minuta de decreto golpista.
Gonet questionou Cid se intervenção militar era assunto frequente nas reuniões mensais das forças especiais ou se tinha mais conversas “recreativas” ou “assunto entre amigos”.
“Na verdade, eu participava do grupo, mas se fui uma ou duas vezes foi muito. Era um barzinho aqui ou restaurante ali. Era como se marcássemos um churrasco em casa, era recreativo. Isso de intervenção militar ficou mais em voga após o 2º turno. Antes disso, as Forças Armadas nunca deram bola”, respondeu Cid.
Mauro Cid afirmou que o objetivo do ex-presidente Jair Bolsonaro sempre foi encontrar fraude nas urnas eletrônicas. “A grande preocupação do presidente, no meu ponto de vista, sempre foi encontrar uma fraude nas urnas, né, coisa que sempre foi muito ostensivo dentro da opinião do presidente. Ele sempre buscou uma fraude nas urnas”, afirmou Cid.
Moraes perguntou o que militares falaram sobre ele durante uma confraternização, e Cid disse: “O senhor foi muito criticado.” Moraes respondeu “Só? O senhor tem que falar a verdade, eu estou acostumado”, e arrancou risadas dos presentes na sessão.
Moraes ironizou um áudio exibido pelo advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, em que empresários, como Luciano Hang, teriam pressionado o ex-presidente a tomar uma atitude para não deixar Lula ser presidente. “O senhor vai pedir aditamento da denúncia? Em relação aos empresários e o [ex-ministro da Saúde] Pazuello?”, questionou.
Questionado pelo advogado de Braga Netto sobre a demora de revelar a informação do dinheiro em caixa de vinho, Cid alegou que, para ele, estava “dentro de um contexto de uma manifestação dentro do que o Exército aceitava”.
“Tudo que foi tratado, para mim, estava sendo direcionado naquelas manifestações. Na minha cabeça, vi que era um dinheiro para trazerem manifestantes para ‘engordar’ a manifestação”, disse ele. Moraes perguntou se era normal receber o dinheiro em caixa de vinho, Cid diz que “normal não seria”. “Naquele contexto, nas manifestações em frente aos quartéis, não vou dizer que não vi nada demais, mas como foi pedido ajuda, tentei conseguir de alguma forma.”
Por ICL notícias
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